terça-feira, 9 de março de 2010

A ORIGEM DOS CONTOS DE FADA

Os contos de fadas são uma variação do conto popular ou fábula. Partilham com esses o fato de serem uma narrativa curta, transmitida oralmente, e onde o herói ou heroína tem de enfrentar grandes obstáculos antes de triunfar contra o mal. Caracteristicamente envolvem algum tipo de magia, metamorfose ou encantamento, e apesar do nome, animais falantes são muito mais comuns neles do que as fadas propriamente ditas. Alguns exemplos: "Rapunzel", "Branca de Neve e os Sete Anões" e "A Bela e a Fera".
Diferentemente do que se poderia pensar, os contos de fadas não foram, originalmente, escritos para crianças, muito menos para transmitir ensinamentos morais (ao contrário das fábulas de Esopo). Em sua forma original, esses textos traziam doses fortes de adultério, incesto, canibalismo e mortes hediondas. Segundo registra Cashdan:

Originalmente concebidos como entretenimento para adultos, os contos de fadas eram contados em reuniões sociais, nas salas de fiar, nos campos e em outros ambientes onde os adultos se reuniam - não nas creches. ”

Mais adiante, Cashdan exemplifica:

É por isso que muitos dos primeiros contos de fada incluíam exibicionismo, estupro e voyeurismo. Em uma das versões de Chapeuzinho Vermelho, a heroína faz um striptease para o lobo, antes de pular na cama com ele. Numa das primeiras interpretações de A bela adormecida, o príncipe abusa da princesa em seu sono e depois parte, deixando-a grávida. E no conto A Princesa que não conseguia rir, a heroína é condenada a uma vida de solidão porque, inadvertidamente, viu determinadas partes do corpo de uma bruxa. ”

Ainda conforme Cashdan, "alguns folcloristas acreditam que os contos de fada transmitem 'lições' sobre comportamento correto e, assim, ensinam aos jovens como ter sucesso na vida, por meio de conselhos.(…)A crença de que os contos de fada contêm lições pode ser, em parte, creditada a Perrault, cujas histórias vem acompanhadas de divertidas 'morais', muitas das quais inclusive rimadas". E ele conclui: "os contos de fada possuem muitos atrativos, mas transmitir lições não é um deles".

Contos de fadas para crianças

As versões infantis de contos de fadas hoje consideradas clássicas, devidamente filtradas e suavizadas, teriam nascido quase por acaso na França do século XVII, na corte de Luís XIV, pelas mãos de Charles Perrault. Para Sheldon Cashdan, em referência aos países de língua inglesa, a transformação dos contos de fadas em literatura infantil (ou sua popularização) só teria mesmo ocorrido no século XIX, em função da atividade de vendedores ambulantes ("mascates") que viajavam de um povoado para o outro "vendendo artigos domésticos, partituras e pequenos volumes baratos chamados de chapbooks". Estes chapbooks (ou cheap books, "livros baratos" em inglês), eram vendidos por poucos centavos e continham histórias simplificadas do folclore e contos de fadas expurgados das passagens mais fortes, o que lhes facultava o acesso a um público mais amplo e menos sofisticado.

Acompanhe, a seguir, um relato comparativo com as versões originais de alguns famosos contos de fada:

Chapeuzinho Vermelho

A história atual todos nós conhecemos: chapeuzinho vermelho, lobo mau, vovozinha e lenhador... Não preciso explicar certo!? Mas, na história original o lenhador não existe, na verdade a chapeuzinho e sua vovó são devoradas e pronto, parou por ai, nada de final feliz.
Em outra versão ainda mais antiga, a Chapeuzinho faz um strip-tease pro lobo (que, às vezes, era representado por um lobisomem ou um ogro) para assim poder fugir enquanto ele ainda estava "se distraindo". Existe ainda uma versão mais bizarra da história, em que o lobo estripa a vovó e obriga a Chapeuzinho a jantá-la com ele. A Chapeuzinho, que não é besta, diz que precisa ir ao banheiro (que, naquela época, ficava do lado de fora das casas) e fugia. Percebam que, em todas as versões que citei, o lobo sempre se dá bem no final, de uma forma ou de outra.

Branca de Neve


Na história original da Branca de Neve, a "madrasta malvada" (que em algumas versões não é madrasta e sim sua própria mãe!) não cai de um penhasco, como é mostrado no final do filme da Disney. Ela, na verdade, é forçada a vestir sapatos de ferro em brasa e dançar até cair morta. Outra bizarrice nessa história é a idade da Branca de Neve. Na versão dos Irmãos Grimm, ela tem apenas sete anos, ou seja, príncipes pedófilos eram normais naquela época. E ao invés de dar um "beijo de amor", o príncipe carrega o CORPO MORTO (ou adormecido, se vocês quiserem) da Branca de Neve para seu palácio, para que assim ela estivesse sempre com ele. Depois de algum tempo, um de seus servos, cansado de ter que carregar um caixão de um lado pro outro, resolve descontar suas frustrações dando uma baita SURRA na Branca de Neve. Um dos golpes desferidos no estômago faz com que ela vomite a maçã envenenada e assim volte à vida.
Mas de todas as mudanças feitas através dos anos, a mais sangrenta foi em relação ao coração da Branca de Neve. Nas histórias mais antigas, a Rainha não pedia ao caçador para trazer só ele. Ela queria também outros órgãos principais como pulmão, fígado etc... Fora isso, ela também queria um jarro com seu sangue (acho que o caçador precisou mais que um cervo pra resolver isso!). Vocês devem estar se perguntando: "Pra quê tudo isso?". Simples: ela queria JANTAR a pobre Branca de Neve! Bizarro, não!?

A Bela Adormecida


Essa sim tem um passado bizarro. Nas primeiras versões, ao invés de espetar o dedo no fuso de uma roca e cair desacordada, a bela adormecida tinha uma "farpa" encravada debaixo da unha. Parece uma mudança pequena, mas ela nos leva ao ponto que realmente importa. Nessa mesma versão, o príncipe não é tão "encantado" assim e resolve, digamos... "se satisfazer" na Bela, ainda adormecida. Depois de satisfeito, ele simplesmente vai embora. Nove meses depois, a Adormecida dá à luz gêmeos que, em busca de leite, acabam acidentalmente chupando o dedo dela, retirando, assim, a farpa amaldiçoada.
E a coisa não para por aí: o príncipe que a engravidou (estuprou) continuou voltando (se é que vocês me entendem...) durante os nove meses da gestação. Quando ele chegou lá e encontrou a bela, já não mais Adormecida e com duas crianças, ele decidiu se casar com ela (pelo menos isso, né?), mas não poderia levá-la ao seu castelo, pois sua mãe era uma OGRA que tinha o hábito de comer qualquer criança que aparecesse em seu caminho.
Por isso ele esperou alguns anos até que seu pai morresse e ele virasse rei para aí então poder levar sua mulher tranquilamente para seu reino. E assim aconteceu, mas na primeira viagem que ele fez, sua mãe ogra resolveu fazer o que todo ogro tem que fazer: comer seus dois netos e, não satisfeita, também sua nora. Mas, com a ajuda do cozinheiro, a Bela Acordada conseguiu se esconder até o retorno de seu marido que, quando ficou sabendo dos planos de sua mãe, mandou matá-la imediatamente.
Em outras versões, o príncipe na verdade já era rei, e a mãe ogra era a esposa do rei, o resto todo é bem parecido. A esposa ciumenta quer, como vingança, comer (no sentido alimentício) os dois filhos bastardos do rei, mas acaba sendo descoberta e é queimada viva numa fogueira. Moral da história: se você encontrar uma mulher desmaiada num bosque, se divirta e não volte nunca mais; ou, se você for uma ogra, não tente comer seus netos; ou ainda, se vocês for uma mulher adormecida no meio do bosque, use cinto de castidade!

Cinderela


Esse é um dos contos de fadas mais antigos já registrados, e com a maior quantidade de variações também (+ou-700). Algumas versões envolvendo um peixe gigante no lugar da fada madrinha datam de 850 AC! Em outras histórias, a fada madrinha é, na verdade, uma árvore que nasce sobre o túmulo da mãe da Cinderela.
Uma das modificações mais brutais ocorre no momento em que as irmãs malvadas tentam calçar os sapatos de cristal para enganar o príncipe, numa versão bem bizarra da história, uma delas corta fora seus dedos do pé para vestir o sapatinho e assim enganar o príncipe. Mas ela é desmascarada pelos pássaros amigos da Cinderela, que mostram ao príncipe o sangue escorrendo pelos sapatinhos, e depois, como vingança, arrancam os olhos das duas irmãs que terminam suas vidas cegas e mancas.
Há ainda uma outra versão (na verdade, ela é tão diferente que alguns nem a consideram como uma versão e sim um tipo de CINDERELLA ORIGINS) onde a Cinderela era filha de um rei viúvo (algumas vezes a própria Cinderela foi quem matou a mãe) que jurou nunca mais se casar, a não ser que encontre uma mulher tão bela quanto a falecida esposa, que tivesse os cabelos cor de ouro, e que conseguisse calçar os mesmos sapatos da finada (fetiche por pés sacou!?). Acaba que sua filha (Cinderela) preenche todos os requisitos, como 2 e 2 são 4, nada mais lógico que ele se casar com a própria filha.
Ela, por sua vez, na tentativa de fugir do casamento com seu próprio pai velho, barrigudo e incestuoso, foge pelo mar num armário de madeira (eu também achei estranho mais fazer o quê, os caras eram criativos oras), no final ela consegue fugir, mas acaba do outro lado do mundo, trabalhando como escrava na casa das irmãs malvadas, e daí pra frente começa a historia que vocês conhecem.

A Pequena Sereia


A grande diferença nesse conto está em seu final. Ao invés de se casar com o príncipe e viver feliz para sempre, a Pequena Sereia na verdade é abandonada por ele logo após ela beber a poção mágica que a transforma em mulher. E como tudo tem seu preço, a poção tem um pequeno efeito colateral: durante o resto de sua vida, a pequena ex-sereia iria sentir uma dor tremenda nos pés, como se eles estivessem pisando constantemente em pontas de facas. Vendo a traição, a Bruxa do Mar lhe oferece, como forma de reverter o encanto e voltar a ser uma sereia, um punhal para que ela matasse o príncipe e, banhando suas pernas com seu sangue, faça-as voltar a ser uma cauda de peixe. Mas, ao invés disso, a pobre sereiazinha, incapaz de assassinar seu grande amor, decide pular no mar e morrer, se dissolvendo em espuma para sempre. Uma vez mais, nada de "final feliz". Temos uma história de amor, sofrimento e castigo.

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